De acordo com o filósofo Sidney Silveira:
[...] entre uma virtude e um vício oposto, muitas vezes, há tanta semelhança que é dificílimo fazer a distinção entre eles. Há pusilanimidade parecida com prudência, prodigalidade com aparência de liberalidade, imprudência com fumos de coragem, avareza semelhante a equilíbrio nos gastos, adulação com ares de afabilidade, etc. Para julgar com retidão, é preciso atentar para os atos correlatos ao vício ou virtude em questão, pois estes nunca vêm sozinhos.
Uma dessas confusões se dá entre a benignidade e a covardia. Na verdade, é ridículo pensar que um sujeito é bom apenas porque não briga com ninguém, não discute sobre nada, mas busca sempre a convergência. Acentua antes os pontos em comum e minimiza as discordâncias entre as pessoas. De fato, isto em muitos casos pode ser boa coisa, pois, antes de tudo, revela uma predisposição para a concórdia que, em si, deve ser louvada. O problema se dá quando os pontos de desacordo se referem a algo de capital importância, e mais ainda: quando implicam o erro ou o acerto, a verdade ou a mentira em relação a determinado ponto. Então, aquilo que parecia de uma bondade alvar (como dizia caricatamente Nelson Rodrigues de alguns de seus personagens de crônicas) revela o seu caráter maléfico. E o que parecia ser o retrato de um espírito bondoso e pacificador, mostra ser o signo de uma omissão — que pode ser mais ou menos culpável na exata medida do conhecimento com que a ação foi levada a cabo.